O QUE É SER CICLOATIVISTA HOJE
O essencial para o cicloativismo é,
simplesmente, usar bicicleta.
O texto abaixo foi publicado, originalmente, no site meninamalouca.
Saí do estado de São Paulo em 2009, ano em que deixei de
participar da agenda cicloativista. De lá fui pra Porto Velho e Santa Maria,
dois lugares em que não encontrei outro cicloativista.
Desde então não me reuni mais com pessoas preocupadas em divulgar
a bicicleta enquanto meio de transporte e as regras de trânsito que a concernem
(tanto para motorizados como para não-motorizados). No meu círculo, essas
pessoas eram ligadas ao Cicloviável, o grupo que tínhamos em Campinas. Pra mim,
esse grupo foi uma plataforma de discussão sobre mobilidade urbana. Outra
forma de ativismo que encontrei na época foi a bicicletada paulista. Logo
percebi que muitos dos participantes da bicicletada produziam, na internet,
material sobre a bicicleta enquanto meio de transporte.
O meu cicloativismo sem os outros se resume ao uso da bicicleta.
Decidi que não quero ter um carro (assim como não quero ter uma televisão)
porque não quero me tornar dependente dele. Simples assim. Usar um carro
implica em custos (gasolina, manutenção, IPVA, licenciamento, estacionamento
etc.), poluição do ar, maior ocupação da via pública por um bem privado (o que
se mostra grave nos engarrafamentos) e stress. A responsabilidade pela vida do
outro é maior quando se dirige um veículo motorizado.
Não é fácil entender esse cicloativismo. É a terceira vez que
alguém diferente no meu prédio toca a campainha da minha casa perguntando se eu
uso a minha garagem. As pessoas olham pra minha vaga e concluem que ela está
livre, já que ela está ocupada por três bicicletas aparentemente invisíveis. Na
verdade, agora são cinco, porque dois outros moradores resolveram abrigar suas
bicicletas na minha vaga espaçosa.
Os cicloativistas de hoje são pessoas que decidiram não usar
carro. E isso é difícil de entender numa sociedade em que é natural que todos
tenham carro. A oferta gera demanda: a casa prototípica vem com a garagem, as
ruas são asfaltadas e largas para acolherem carros, é possível adquirir um
carro mesmo sem ter dinheiro para pagá-lo.
Os cicloativistas de hoje são de classe média, ou seja, poderiam
ter um carro. Ao invés disso, usam a bicicleta e, através do exemplo, esperam
gerar demanda por infraestrutura para a bicicleta como meio de transporte
seguro na cidade. Alguns deles não esperam, vão lá e dialogam com o poder
público, marcam entrevista com o prefeito às 6 da manhã. Renata Falzoni relata
sobre essa entrevista.
Os cicloativistas de hoje são
indivíduos (agindo de variadas maneiras, pensando por escrito em seus blogs).
Não necessariamente fazem parte de um coletivo, muito menos sob a liderança de
qualquer guru. Em 2009, me debati muito com o tema da
horizontalidade na bicicletada paulista. Dionizio e eu não acreditávamos nessa
horizontalidade e desconfiávamos que havia (não um líder, mas) um grupo que
direcionava a massa crítica. No podcast acima citado (e indicado pelo
Dionizio), Renata Falzoni confirma nossas hipóteses: “Esse movimento, que é
horizontal, até sem a minha aprovação – mas quem sou eu pra aprovar”.
Por fim, os cicloativistas de
hoje não querem ser identificados como esportistas. Recentemente li um texto de uma professora do IEL em que ela
critica o encantamento dos ciclistas com o movimento Cycle Chic, que consiste
em usar roupas “chiques” quando se pedala. Sabendo da multiplicidade de
cicloativistas e sabendo que a autora do texto desconhece o movimento, vejo o
cicloativista entre os dois extremos: nem esportista, nem de terno e gravata ou
salto alto, mas de acordo com a ocasião. A bicicleta é meio de transporte,
então, se o caminho leva ao parque, roupas esportivas são adequadas; se o
caminho leva ao trabalho, roupas de trabalho são adequadas.
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