A MÚSICA COMO LUGAR NO MUNDO


O primeiro instrumento que Dominguinhos aprendeu a manejar foi o pandeiro. Lá pelos cinco ou seis anos de idade ele se apresentava em feiras, portas de igreja e hoteis junto de dois dos nove irmãos, para ajudar a colocar alguns trocados dentro de casa – uma casinha simples em Garanhuns, no agreste pernambucano.  O pai, pequeno agricultor e sanfoneiro, deixava que o filho arranhasse alguns acordes no instrumento vez ou outra, mas a sua primeira sanfona ele ganhou de Luiz Gonzaga. As cenas iniciais do documentário Dominguinhos, que estreia nacionalmente hoje (22), deixam claro que a relação do músico com seu instrumento ultrapassava qualquer noção de mercado. Para Dominguinhos, abrir e fechar o fole da sanfona era o mesmo que respirar.
 
“Ele era um músico nato. Tocar era a maneira de ele estar no mundo, vivo e respirando”, diz o compositor e produtor musical Eduardo Nazarian, um dos diretores do filme. Ao lado de Mariana Aydar e Duani, ele se embrenhou pela vida e obra de Dominguinhos e durante seis anos o trio se dedicou à concretização do projeto. O resultado é um retrato sensível de um artista que se apresentou em orquestras de rádio, viveu o início da modernização da música nordestina no sul do país, a chegada da Tropicália e, ainda assim, se declara um solitário. “Acho que a solidão é uma coisa do próprio artista”, diz.

Em Dominguinhos são as imagens, canções e sensações que carregam o espectador pela história do músico, narrada por ele mesmo – da infância em Garanhuns aos 72 anos de vida, quando o corpo envelhecido não aguenta mais o peso da sanfona. Grande parte das imagens são raras e foram garimpadas em arquivos de editoras, gravadoras e outras vinte fontes de materiais. Uma parte complicada do trabalho, segundo Nazarian, pois a burocracia dificulta o acesso às imagens e fonogramas, que muitas vezes se encontram quase degenerados. “Não deixa de ser um tema para a cultura brasileira, para quem quer fazer vídeo ou filme, é tudo muito difícil. Mas acredito que conseguimos algo muito interessante que espero incitar outras pessoas a procurar”.
 

Seja irreverente nos duetos com Anastacia, sua segunda esposa e parceira musical, ou emocionado na velhice ao interpretar De volta pro aconchego acompanhado por uma orquestra, há sempre uma nova faceta de Dominguinhos a se descobrir. Para o diretor Eduardo Nazarian, o documentário foge da imagem típica do músico nordestino herdeiro de Luiz Gonzaga. “Mostramos o lado irreverente, improvisador, instrumental. Infelizmente grandes artistas às vezes são colocados numa prateleira. O documentário surpreende nesse sentido, pois mostra muito mais do que isso”.

Assista a um vídeo emocionante do sanfoneiro Garanhuense com o Rei do baião.


Fonte:
http://revistacult.uol.com.br/home/2014/05/a-musica-como-lugar-no-mundo/

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